Coluna dos Editores

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A Coluna dos Editores é um espaço dedicado ao compartilhamento de experiências e insights de notáveis profissionais da área de resolução de disputas. Um dos tópicos mais recorrentes entre os jovens arbitralistas e profissionais de ADR é sobre como dar continuidade à formação jurídica.

É verdade que grande parte dos profissionais busca oportunidades no exterior, sobretudo na área de arbitragem. Contudo, alguns conhecimentos sobre o processo ainda são desconhecidos, razão pela qual convidamos o Gustavo Vaughn, que atualmente trabalha em Nova Iorque, como advogado internacional, no escritório Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP. O Gustavo concluiu em maio de 2022 o LLM na Columbia Law School e, antes disso, em 2021, concluiu o mestrado em direito processual na Faculdade do Largo de São Francisco.

Em uma conversa descontraída, Gustavo dividiu com a NewGen News um pouco de sua trajetória profissional e deu dicas para a construção de uma candidatura competitiva para mestrado (LLM) em universidades nos Estados Unidos, além de ter contado um pouco sobre sua experiência profissional por lá.

 

Editoria da NewGen News: Para começar a conversa, gostaríamos que você nos contasse um pouco sobre como começou a sua carreira no Direito e, especialmente, como foi o seu primeiro contato com a área de arbitragem.

Gustavo Vaughn: “Eu decidi fazer direito porque eu queria ser juiz. Meu pai é advogado e sempre dizia que se fosse para ser um advogado ou trabalhar com o direito seria o caso de procurar horizontes diferentes, fora do interior de São Paulo, onde nasci.

Comecei a graduação em direito na FACAMP (Faculdades de Campinas). Eu fiz duas semanas de curso lá e fui aceito na PUC (Pontifícia Universidade Católica), em São Paulo. Por isso, deixei o curso na FACAMP, me mudei de Americana para São Paulo e as coisas começaram a acontecer.  Realmente muitas portas se abriram. São Paulo te dá outro horizonte no sentido de oportunidades de trabalho.

Eu comecei a trabalhar no segundo ano da faculdade, com a Desembargadora Maria Lúcia Pizzotti que, para mim, é um exemplo em todos os aspectos. Eu trabalhei pouco mais de um ano com ela e, até então, não tinha tido nenhum contato com arbitragem na faculdade, não sabia o que era.

Depois disso, eu fui trabalhar no Sergio Bermudes. Foi uma experiência incrível, o Sergio Bermudes é um escritório que permite o desenvolvimento de muitas habilidades, das coisas mais simples e corriqueiras do Processo Civil até as coisas mais complexas. Quando eu estava trabalhando lá, comecei a ter contato com arbitragem; me lembro de ter ajudado em um ou dois casos.

E me lembro também de uma coisa curiosa: na minha turma de amigos da PUC, as pessoas não falavam sobre arbitragem. Eu não sabia que a PUC tinha um time de Vis Moot, ou da Competição Brasileira de Arbitragem, ou que essas oportunidades estavam disponíveis para mim, ao meu lado.

Nessa mesma época, eu tive uma matéria optativa na PUC sobre arbitragem que tinha aulas espetaculares com o Prof. Georges Abboud, que ocupada naquela ocasião a cadeira do Prof. Nelson Nery, e eu passei a me interessar mais pela área. Foi no 5º ano de Direito que tive uma virada de chave com relação à arbitragem.

Eu fiquei praticamente dois anos no Sergio Bermudes mas, no final da graduação, eu saí de lá e fui para o escritório do Ministro Cesar Asfor Rocha, que foi advogado antes de ser Ministro do Superior Tribunal de Justiça, se tornou ministro, aposentou-se e abriu uma boutique de resolução de disputas focada em arbitragem e contencioso judicial.

Então, basicamente, na minha carreira profissional, eu trabalhei como advogado neste escritório por mais de seis anos. Lá, o volume de trabalho era maior em processos judiciais, mas também tínhamos arbitragens e processos judiciais em apoio à arbitragem”.

 

Editoria da NewGen News: Você pode nos contar um pouco sobre como foi o processo de candidatura e sobre quando soube que seria a hora certa de tentar?

Gustavo Vaughn: O resumo do resumo: a vontade de fazer essa mudança sempre existiu, mas foi concretizada efetivamente durante a pandemia. Além disso, foi um momento importante porque a minha noiva também decidiu cursar o LLM.

Assim, decidimos fazer o processo de candidatura juntos e, na verdade, se eu consegui fazer uma candidatura competitiva, foi devido a ela, e não a mim. Ela foi fundamental para esse processo.

No final, ambos cursamos LLM em NY, mas em universidades diferentes. Isso foi bom porque fizemos turmas diferentes, redes de networking diferentes, amigos diferentes (alguns em comum, naturalmente) e conhecemos professores diferentes de duas faculdades incríveis.

O LLM em si, ainda que você não queira trabalhar necessariamente fora, é uma experiência incrível. Todos que possam, com certeza, devem fazer. É uma experiência de vida, pessoal e profissional muito diferente. Você começa a ver as coisas de forma muito diferente, você vai conviver com muita gente diferente, de lugares diferentes, e é interessante conhecer outros modelos de vida para entender o que gostamos e como as coisas funcionam para nós”.

 

Editoria da NewGen News: Vocês só se candidataram para universidades nos Estados Unidos? O projeto sempre foi estudar em uma universidade da Ivy League?

Gustavo Vaughn: “Eu sempre fiquei muito receoso com essa questão de candidatura porque eu imaginava que seria muito mais difícil ser aceito em uma dessas faculdades. Tanto é que não aplicamos só para faculdades da Ivy League: a nossa estratégia foi olhar as top 15 universidades do ranking dos EUA em LLM e, delas, a gente aplicou para 8 faculdades. E deu certo, os resultados foram ótimos.

A nossa decisão para focar nos Estados Unidos foi pelo momento. Não tivemos nada de muito concreto ou fato específico que justifique isso, mas pensamos que talvez fosse mais interessante para a rede de trabalho depois, para tentar alguma coisa como advogado internacional”.

 

Editoria da NewGen News: O que você acha que fez a sua candidatura competitiva? Tem alguma dica que você pode dar para ajudar quem também estiver nesta fase?

Gustavo Vaughn:Eu tenho um amigo que fez LLM na Universidade da Pensilvânia e está fazendo um trabalho brilhante em rede social, que é o Luiz Henrique Fernandes. Ele é dono da página de Instagram “Por dentro do LLM”, que vale a pena conhecer e que pode ajudar neste processo todo de candidatura.

O que eu diria é o seguinte: é muito importante, para o LLM, você conversar com as pessoas que já fizeram, inclusive para entender qual foi a experiência delas em certa faculdade ou no geral.

Em segundo lugar, a candidatura tem que ser algo muito bem preparado e eu recomendo que, independentemente do seu conhecimento na língua, você mande os documentos da application para alguém revisar.

É importante, no personal statement [carta de motivação ou apresentação pessoal], você colocar a sua experiência pessoal, quem é você, e como você pode agregar naquela faculdade. Não é apenas dizer “tenho x livros publicados”, “fiz x cursos” e “advoguei nas maiores causas”, não é isso. Isso o seu CV vai mostrar. Tem que dizer algo que não está lá, e que seja realmente pessoal.

Inclusive é relevante também eventualmente fazer uma pesquisa sobre a universidade na qual você pretende estudar e tentar fazer links dessas informações com os documentos da sua candidatura. Isso é muito legal para mostrar para quem você está se dirigindo, como você pode agregar para faculdade ou para o curso”.

 

Editoria da NewGen News Se você pudesse destacar algum ponto do seu CV, da sua experiência ou da sua carta, que foi fundamental para conseguir a vaga em Columbia, o que você diria?

Gustavo Vaughn:Eu tentei ser verdadeiro no personal statement; as cartas de recomendação seguiam o padrão e as recomendações que as faculdades pedem, também.

É importante pedir a recomendação de alguém que tenha alguma relação ou proximidade acadêmica com você de fato, não só para quem é um grande nome na sua área de atuação. Os avaliadores não gostam de alguém que seja um grande nome com quem você tenha tido contato eventual, porque isso soa como uma “carteirada”, então isso não pega tão bem. Se você conseguir a carta de recomendação de alguém próximo a você no âmbito acadêmico, isso é ótimo e, também, no âmbito profissional.

Também acho que me ajudou bastante ter publicado alguns artigos antes da candidatura; ter terminado mestrado, uma pós-graduação, o que de alguma maneira mostrava um perfil acadêmico, uma dedicação acadêmica. Eu já tinha me conectado com algumas instituições no Brasil.

De uma maneira geral, eu acho que é importante desenvolver atividades além do trabalho: grupos de estudo, associações de arbitragem, associações estudantis. Fazer parte disso é importante. Ter boas notas também é algo a ser levado em consideração.

Ouvi falar também que, para além das cartas de recomendação, há utilidade em pedir recomendações a ex-alunos da universidade para a qual você está se candidatando via e-mail. Isso porque as faculdades tendem a responder essas mensagens e informar que farão anotações acerca das recomendações em questão. Em quase todas as candidaturas que eu e a Natália fizemos, contamos com e-mails de amigos que fizeram LLM nas universidades em questão, e isso foi positivo.

Pedir a outras pessoas que revisem os documentos também é relevante. As pessoas que já estudaram na universidade-alvo são um termômetro legal, porque é sempre bom saber como o outro lê o material. Na minha experiência, as pessoas foram sinceras, dizendo “olha, dá para melhorar aqui”, “vamos mudar”.

Então, o processo da carta, do personal statement, não é algo simples. O processo é de idas e vindas, vão ter sugestões de amigos, de pessoas que leram. Eu tive realmente ajuda de pessoas que mudaram partes do texto, não tenho vergonha de dizer isso, e que assim ficou melhor, ficou legal. O pessoal do LLM, que já passou por isso, e sabe como é, tende a se ajudar muito.

Além disso, a forma como você conta, a narrativa conta muito. Para qualquer coisa que a gente faz na vida, a narrativa importa”.

 

Editoria da NewGen News: Depois de falarmos um pouco da sua experiência durante a sua candidatura para o LLM, gostaríamos que você nos contasse um pouco da sua experiência durante o curso. Por exemplo, que nos dê conselhos sobre o que fazer lá para extrair o máximo da oportunidade e, depois, contar como foi o seu caminho até conquistar uma vaga em um escritório americano.

Gustavo Vaughn: Vocês dividiram bem as fases, como começou, o desenvolvimento disso e o pós.

Não acho que necessariamente você tem que fazer um LLM como uma porta de entrada para um trabalho em um escritório internacional. Entretanto, eu super recomendo que façam isso, porque vale muito a pena, certamente.

Com relação ao processo para conseguir uma vaga de trabalho, no geral, os escritórios americanos e europeus vão te contratar porque tem uma demanda específica, talvez te contratem como provisório e o tempo para ficar no escritório vai depender mais de você.

De uma certa maneira, em razão da presença do Brasil no exterior, as empresas brasileiras geralmente precisam contratar escritórios americanos. Isso dá mais oportunidades, abre mais portas para que o escritório americano tenha justificativa para contratar um advogado internacional, do Brasil, no nosso caso.

Para isso, recomendações de escritórios brasileiros funcionam muito bem. Isso porque escritórios internacionais tendem a recepcionar advogados visitantes de escritórios parceiros, o que faz sentido para estreitar relações comerciais de ponto a ponto.

Pode ser interessante também trabalhar em um escritório ou ter contato com escritório no Brasil que tenha alguma abertura com escritório estrangeiro e que possa te abrir uma porta para uma entrevista.

Independentemente disso, de você ter ou não uma boa recomendação do Brasil, para que você consiga uma entrevista ou posição como advogado internacional, eu acho muito válido ir atrás, buscar networking, buscar falar com sócios de LATAM de arbitragem. E é importante fazer o quanto antes porque as pessoas vão se mexer. Eu cheguei em NY e na primeira semana eu estava soltando e-mail”.

 

Editoria da NewGen News: E existem planos de voltar a advogar no Brasil?

Gustavo Vaughn: A experiência no escritório tem sido incrível para mim, estou muito feliz. Acho que todo mundo que tiver oportunidade de tentar trabalhar aqui, tem que tentar e, se tiver oportunidade de vir, com certeza aceitar.

Sobre o futuro, é difícil dizer, porque envolve muitas coisas. A princípio, eu volto para o Brasil. Mas tenho muita vontade de continuar trabalhando com direito internacional, com litígios transnacionais, disputas complexas envolvendo leis diferentes, países diferentes, línguas diferentes, e eu acho que um escritório internacional como o Cleary propicia isso”.

 

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