Coluna dos Editores

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A Coluna dos Editores, nova seção da NewGen News, tem como principal objetivo a difusão de conversas com notáveis profissionais da área de resolução de disputas, de modo que possam contar suas histórias, além de compartilhar experiências e insights.

O primeiro convidado é o Prof. Carlos Eduardo Stefen Elias, Bacharel, Mestre e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo; sócio fundador da Carlos Elias Arbitragem (CEARB), no qual atua principalmente como árbitro, após mais de 15 anos de prática pré-contenciosa e contenciosa em disputas complexas.

Em uma conversa descontraída, Prof. Elias dividiu com a NewGen News um pouco do gosto pelo que faz, dos ônus e bônus de atuar em arbitragem, além de ter dado valiosos conselhos para os nossos Editores.

Leiam abaixo os principais trechos da segunda parte da entrevista. A primeira parte pode ser lida aqui: Coluna dos Editores – Blog NewGen.

NewGen News:  Além da profunda expertise, os profissionais da área de arbitragem no Brasil são largamente reconhecidos por suas habilidades de oratória e relacionamento interpessoal. Qual o conselho o senhor daria para as pessoas de personalidade mais introspectiva que também desejam construir suas carreiras na área?

Prof. CE: Eu tinha como sonho de vida decidir os processos sem ter que me relacionar com as pessoas. Até que, dentro desta área mesmo de arbitragem, além dos casos serem legais, encontrei as pessoas mais inteligentes e mais generosas que eu conheço.

Acredite, eu gosto das pessoas que fazem parte desse círculo, então, eu sei que preciso me mostrar um pouco e é divertido, porque eu estou saindo da caverna para me relacionar com pessoas legais.  O meu conselho é: não pense que você está fazendo um trabalho, mas, sim, esteja ali para conhecer, ouvir, e aprender um pouco mais – também sobre o que não é direito.

NewGen News:  Durante a sua fala, concluímos ter a sorte de acompanhar profissionais admiráveis exercendo o seu ofício, os quais, mesmo quando “chegam lá”, mantém a paixão e dedicação a cada caso. Ficamos muito felizes.

Prof. CE: Esse “lá” não existe. Olhando bem para trás, eu acho que poderia ter vivido com mais leveza, sabedoria e dispêndio de energia no que realmente interessa. Pelo menos, eu era conformado com o fato de que teria que treinar muito antes de poder pegar no timão, ver para onde o navio vai. Como nos navios a vapor, você começa jogando carvão na caldeira, e vai ter chance para começar a ser capitão.

Só é preciso assegurar-se que, quando essa chance chegar, você vai estar preparado para isso, psicologicamente e tecnicamente. O mestrado pode dar brilho no currículo, mas o desenvolvimento acontece vendo documentos; estudando qual tese se encaixa na sua causa, é no dia a dia, não tem atalho. É até fácil entrar na arbitragem, difícil é sobreviver nela. Sobrevive quem gosta.

E, também, posso dizer para que você cuide para ser suficientemente boa quando a responsabilidade vier. Não corra atrás das responsabilidades ainda, esteja pronta para quando elas chegarem – e elas vão chegar. E aí, quem é diferente faz a diferença.

Editoria NewGen News:  Gostaríamos de saber um pouco mais sobre sua atuação, tanto como advogado, quanto como árbitro. São ações conexas, mas muito distintas. Eu já trabalhei como assistente de árbitro e, agora, representando clientes em arbitragens, eu vejo que é tudo muito diferente.

Ter trabalhado como assistente moldou minha visão para o trabalho do árbitro, de uma forma que eu nunca tinha imaginado. É uma responsabilidade muito grande dizer o direito e, acima de tudo, prestar um serviço, dar a melhor solução possível para aquela disputa. Isso é muito complicado, então, vocês árbitros têm todo o meu respeito.

Prof. CE:  O árbitro não pode chegar ao final [do procedimento arbitral] com dúvidas. Para resolver as dúvidas que vão acontecer, ele tem que estar inteirado sobre o caso à medida que o processo se desenvolve. É muito difícil e trabalhoso manter todas essas variáveis na cabeça, para elas irem se encaixando antes da hora da sentença. Por isso, o caso precisa de manutenção, o que é muito difícil.

Mas, ainda assim, é factível. E é preciso estar aberto para o caso e não ter receio de mudar de ideia. Eu mudo de opinião em cada causa, porque fazendo isso eu testo as hipóteses. Estou sempre aberto a ser convencido do contrário até a hora de assinar a sentença. E tenho que estar, porque o serviço do árbitro não é de colocar certezas: o que se quer é que o árbitro analise, à luz dos fatos e do direito, qual é a solução jurídica mais adequada para cada disputa.

Um árbitro que não tem dúvidas desde o começo, serve para chancelar a tese de alguma parte ou de outra. Eu não quero isso. Eu quero um árbitro que converse comigo, como também quero um advogado que converse comigo e que me diga de antemão o que ele precisa para decidir. Tanto que tem árbitro que não faz isso, entra mudo, sai calado e no final da arbitragem, a gente não sabe o que é importante e recebe uma sentença que surpreende todo mundo.

E os advogados devem lembrar-se, em audiências, do contato visual, do fato de que estão contando uma história e têm que convencer uma pessoa. Então, aqueles que puderem ter a chance de trabalhar como secretários de tribunal [arbitral], não deixem de ir às audiências.

Editoria NewGen News: Atuar como árbitro sempre foi uma pretensão sua? No meu entender, você não vira árbitro; você está árbitro naquela disputa. Eu não sei se dá para chamar “árbitro” de uma profissão, porque, em verdade, você é um especialista na matéria sobre a qual geralmente é convidado a decidir. Diferentemente do juiz, não é uma toga que você veste e que garante que, após atuar como árbitro em uma disputa, necessariamente você o fará nas próximas.

Prof. CE: O José Emílio fala isso: “eu sou advogado”. Eu não sou árbitro, porque isso não existe. Eu sou árbitro para aquele caso e mais nada.

 Ocorre que, felizmente, quem presta um bom serviço é lembrado. Além disso, você, como advogado, não quer pôr em risco o direito do seu cliente que você quer defender. Então, alguém que estudou e se preparou, terá um quê de recorrência.

 Para isso acontecer, você tem que mostrar que domina e, para mostrar que domina, você tem que ter advogado. Eu acho muito difícil alguém se tornar árbitro sem advogar antes, salvo se escolher um outro caminho, de parecerista, de professor.

 Quando eu comecei a auxiliar o Carmona, eu pensava que queria ser secretário para a vida inteira. Quando estava advogando, só pensava que queria advogar para a vida inteira. Agora como árbitro, eu também quero fazer isso a vida inteira.

 Sorte ou não, eu só vi o futuro acontecer quando parei de me preocupar com ele. Assim, eu só me tornei um advogado quando parei de me preocupar se eu iria ser um bom advogado ou não. Eu só me tornei árbitro quando parei de pensar se eu queria ou não [ser árbitro].

Agora, grande parte da minha atuação é como árbitro, porque, de alguma forma, eu presto um serviço que parece ser relevante para as pessoas e no qual elas confiam. Eu não sei o que vai ser amanhã, mas isso não me preocupa e nem pode me preocupar.

 Quando você está se preocupando em ser a melhor profissional possível, a não se isolar das pessoas, tudo vai acontecer porque, na arbitragem, assim como em todas as outras áreas do direito, existe uma demanda pelos melhores profissionais.

Não corra para queimar etapas. Então, primeiro, se faça necessária aqui. Se você é a melhor estagiária possível, então, muito provavelmente você vai ser uma advogada. Se você é a melhor advogada possível na equipe, muito provavelmente você vai um dia liderar uma equipe. Se você é a melhor advogada de equipe, muito provavelmente você vai ser relevante para o escritório. Se você faz o melhor caso possível, muito provavelmente você vai ser convidada numa outra causa para decidir.

Então, qual é o caminho? Faça bem o que você está fazendo, o resto vai acontecer.

É por isso que os moots funcionam com um gancho para os bons profissionais, porque eles aparecem. É mais uma chance de aparecerem, e, se não for assim, vai ser dentro de cada escritório. O mecanismo é o mesmo. Seja a sua melhor versão hoje, que amanhã você vai ser necessário.

Editoria NewGen News: Nesse cenário, o que você nota em um profissional outstanding?

Prof. CE: A primeira coisa é ter energia suficiente para se aprofundar nos fatos e conhecê-los como ninguém. Em segundo lugar, é ter o preparo jurídico para analisar aqueles fatos à luz de diferentes óticas jurídicas. É muito importante a capacidade analítico-jurídica, que demanda ter estudado para aquele caso e para muitos outros. Muitas vezes o advogado não tem isso e não tem a menor ideia de que isso faz falta. O jovem precisa ter no mínimo uma ideia de como ele pode usar os fatos em algumas teses jurídicas que são do interesse do cliente.

 Então a primeira coisa é resiliência para buscar todos os fatos. E, depois, é um esforço para ter o conhecimento jurídico necessário para saber o que é importante e, juntamente com a equipe, construir o melhor caso para o cliente.

São dois pontos de apoio, sem os quais o advogado vai trabalhar sem nenhum sentido. Ele vai conhecer os fatos, mas que relevância isso tem? Ou então ele vai ser aquele advogado que constrói teorias e, quando vê na prática, aquilo se desmonta porque ele não foi buscar os fatos nos quais aquelas teorias se sustentariam.

Editoria NewGen News: Por fim, onde você se informa? O que você gosta de ler?

Prof. CE:  Eu estou lendo “Discrimination and disparities”, do Thomas Sowell. Gosto de física quântica, gosto de jogos, e tudo isso é material de vida, que é ampla.

Editoria NewGen News: Um conselho, o melhor que você já tiver recebido ou dado, para nos ajudar nesta areia movediça do início da carreira.

Prof. CE: Seja sua melhor versão como profissional e não tenha pressa, porque você vai ser necessário mais cedo ou mais tarde.

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