Os impactos da pandemia aos regulamentos das câmaras arbitrais

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As câmaras arbitrais têm sido protagonistas no combate aos impactos causados pela pandemia de COVID-19 nas arbitragens, em razão de seu papel relevante na prestação de serviços relacionados aos métodos alternativos de solução de controvérsias de forma justa e eficiente. Tais instituições têm sob sua administração centenas de casos, o que dá a elas o poder-dever de garantir que as melhores práticas cheguem às partes, através da edição de regras que permitam a adequação do mercado a novas circunstâncias, como aquelas impostas pela pandemia.

Desde a decretação da pandemia de COVID-19 pela Organização Mundial da Saúde, diversas instituições arbitrais no Brasil emitiram mais de vinte instrumentos normativos para regulamentar suas atividades enquanto durar a pandemia e para organizá-las em atendimento às orientações de distanciamento social e quarentena das autoridades sanitárias.

Analisamos as principais medidas adotadas pelas câmaras arbitrais para mitigar os impactos da pandemia às suas atividades – e aos casos sob sua administração – inseridas em suas novas regras.

Por exemplo, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”) passou a viabilizar a condução de todas as suas atividades remotamente, a partir da suspensão do recebimento de protocolos físicos e de reuniões e audiências presenciais, bem como da gestão exclusivamente eletrônica de procedimentos por meio de ferramentas tecnológicas.

Além das medidas adotadas pelo CAM-CCBC, consideramos também: Câmara Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial (“CBMAE”), Câmara de Arbitragem de Mercado (“CAM”), Câmara de Arbitragem e Mediação da Confederação das Indústrias do Paraná (“CAMFIEP”), Câmara de Arbitragem, Mediação e Conciliação do CIERGS (“CAMERS”), Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem CIESP-FIESP (“CIESP-FIESP”), Câmara de Mediação e Arbitragem ACIF (“CMAA”), Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial do Paraná (“ARBITAC”), Câmara de Mediação e Arbitragem da Fundação Getúlio Vargas (“FGV”), Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial (“CAMARB”), Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (“CBMA”), Centro de Arbitragem e Mediação AMCHAM (“AMCHAM”), Centro de Mediação e Arbitragem da Câmara Portuguesa e a  Corte Internacional de Arbitragem (“CCI”).

Suspensão das atividades presenciais e a manutenção do funcionamento remoto. Com a necessidade de isolamento social,       tanto CAM-CCBC[1] quanto as outras câmaras arbitrais optaram por suspender o atendimento presencial em suas dependências, medida adotada por todas as instituições consideradas. Entretanto, todas as instituições analisadas continuam integralmente operacionais via telefone, e-mail ou por meio de suas plataformas digitais, dando seguimento às arbitragens em andamento e, também, recebendo novos casos.

Recepção eletrônica de requerimentos de arbitragem. A instauração de novos casos também continua funcional: a recepção eletrônica dos requerimentos de arbitragem foi estabelecida por 93% das instituições analisadas e, apesar de dar-se majoritariamente via e-mail – conforme estabelecido pelo CAM-CCBC[2] –, pode ocorrer também por meio de plataformas digitais.

Administração eletrônica dos casos em fase administrativa. As arbitragens em fase administrativa, as quais ainda não contam com Tribunal Arbitral constituído ou árbitro único nomeado, também foram consideradas pelas câmaras arbitrais em seus novos regulamentos: 57% das câmaras analisadas estabeleceram a possibilidade de administração eletrônica para estes casos.

Entre elas, o CAM-CCBC, que, inicialmente, facultou às Partes a adesão ao encaminhamento exclusivamente eletrônico de comunicações eletrônicas nestes casos[3], a partir da edição da Resolução Normativa 40/2020 estabeleceu o encaminhamento eletrônico como regra vinculante e obrigatória para as arbitragens em fase administrativa.

Manutenção dos prazos de protocolo eletrônico. Os prazos de protocolo eletrônico foram mantidos expressamente por 93% das instituições analisadas, entre elas o CAM-CCBC, que estabeleceu na Resolução Administrativa 40/2020 que as petições e documentos deverão ser apresentados por e-mail e disponibilizados na pasta eletrônica compartilhada.

Suspensão do protocolo de vias físicas e o oferecimento de alternativas. Ao passo que a ausência de atendimento presencial pelas câmaras arbitrais gerou pouco impacto sobre os prazos de protocolo eletrônico, o mesmo não pode ser dito, por óbvio, sobre os prazos de protocolo das vias físicas de manifestações, suspensos por 93% das instituições analisadas.

As soluções alternativas variaram entre as instituições: 7% das câmaras arbitrais dispensaram o protocolo de vias físicas por completo; 43% adiaram a apresentação para quando do retorno das atividades presenciais, 15% das instituições disponibilizaram sistemas especiais de protocolo de vias físicas e 7% optaram por notificar os Tribunais Arbitrais para que decidam sobre a necessidade (ou não) de apresentação de pelo menos uma via física das manifestações protocoladas eletronicamente durante a pandemia.

O CAM-CCBC, na Resolução Administrativa 40/2020, determinou que as petições e documentos devem ser apresentados por e-mail e disponibilizados em pasta eletrônica compartilhada, em conformidade com as orientações disponibilizadas pela instituição em seu site.

Alteração do termo inicial de contagem de prazos. Para além do oferecimento de alternativas ao protocolo de vias físicas das manifestações e documentos, 43% das instituições analisadas, dentre elas o CAM-CCBC[4], alteraram o termo inicial de contagem de prazos – que passou do dia seguinte ao recebimento das vias físicas das manifestações, para o dia seguinte ao recebimento das vias eletrônicas.

Suspensão das audiências presenciais e disponibilização de ferramentas para realizá-las remotamente. A atual conjuntura impôs a suspensão das audiências presenciais – o que foi estabelecido por 85% das instituições analisadas.

Apesar disso, 64% das câmaras arbitrais disponibilizaram em suas novas regras mecanismos para permitir a realização de audiências virtuais, entre elas a CAM-CCBC, que passou a viabilizar a realização de audiências remotamente, via Microsoft Teams ou plataforma similar, com o acompanhamento do case manager responsável e de um técnico de TI.

Disponibilização de plataformas digitais para gerenciamento de casos. Apenas 15% das câmaras arbitrais analisadas dispõem de plataformas digitais para a condução eletrônica dos casos. Dessas, 7,5% tem condições de conduzir arbitragens, e 7,5% administram apenas casos de mediação e conciliação. Cabe salientar que 15% das instituições que ainda não possuem plataformas próprias informaram que estão conduzindo processos internos para tanto.

Conclusões. Da análise conjunta das novas regras expedidas pelas câmaras arbitrais, depreende-se que, para mitigar os efeitos da pandemia, as instituições lançaram mão da tecnologia, a fim de adequar as suas atividades para o ambiente virtual, especificamente a condução dos casos.

A troca de manifestações entre as partes passou a ocorrer de forma exclusivamente eletrônica, e o protocolo de vias físicas, suspenso em razão da ausência de funcionamento presencial das instituições, foi dispensado, postergado ou substituído por todas as câmaras arbitrais consideradas, com o fim de evitar atrasos ou mesmo a suspensão dos procedimentos.

Até o termo inicial de contagem de prazos foi adequado para quando do recebimento da via eletrônica das manifestações – e não mais das vias físicas – também para adequar a condução dos casos às circunstâncias atuais.

As reuniões e audiências presenciais, suspensas em função das regras de distanciamento impostas por autoridades sanitárias passaram a ser realizadas remotamente, com a disponibilização de ferramentas e suporte por parte das instituições.

A utilização de plataformas digitais para processamento completamente virtual dos casos também tem crescido e, pelo menos até a data final de nossa análise, está completamente funcional em duas das instituições analisadas, e em fase de implementação em três outras.

É evidente, portanto, a adequação do mercado de métodos alternativos de solução de controvérsias, sob a liderança das instituições arbitrais, criadoras das regras de administração dos casos, ao funcionamento remoto, de modo a possibilitar o acesso à justiça e segurança jurídica também durante a crise sanitária sem precedentes que acontece atualmente.

[1] Com a edição da Resolução Normativa 40/2020, datada de 02.04.2020, o CAM-CCBC estabeleceu a manutenção da suspensão de suas atividades presenciais nos escritórios de São Paulo e Rio de Janeiro, bem como o atendimento via telefone e e-mail.

[2] Nos termos da Resolução Normativa 40/2020, datada de 02.04.2020, os Requerimentos de Instauração de Arbitragens administradas pelo CAM-CCBC devem ser encaminhadas à instituição via e-mail secgeral@ccbc.org.br.

[3] Nos termos do item 3.3 da Resolução Normativa 39/2020, datada de 16.03.2020.

[4] Nos termos da Resolução Administrativa 40/2020, datada de 04.02.2020, item 3.2, V.

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