Entrevista com Silvia Pachikoski

CategoriesBlog

Entrevista – Silvia Pachikoski

A Coluna dos Editores é um espaço dedicado ao compartilhamento de experiências e insights de notáveis profissionais da área de resolução de disputas.

Para a Edição #12 da NewGen News, convidamos Silvia Rodrigues Pachikoski, bacharel em direito pela Universidade de São Paulo, Especialista em Processo Civil (PUC-SP) e em Direito Societário (FGV-SP), árbitra e advogada com mais de 30 anos de experiência, Sócia de L.O. Baptista Advogados, Vice-Presidente do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá e Coordenadora da Comissão de Assuntos Legislativos do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr).

Em conversa ocorrida em 04 de junho de 2025, também disponível em vídeo (acesse aqui!), Silvia compartilhou um pouco de sua trajetória profissional, deu valiosos conselhos sobre construção de carreira na área de resolução de disputas e teceu considerações sobre o atual panorama da arbitragem no Brasil.

Editoria da NewGen News: Gostaríamos de começar falando um pouco sobre o início da sua trajetória profissional. Como foi o seu começo? Como surgiu seu envolvimento com a arbitragem?

Dra. Silvia Pachikoski: Brincando um pouco, foi “lá nos idos do século passado”… São 35 anos de advocacia! Sempre digo que quanto mais a gente estuda, mais preparado está, e mais as oportunidades aparecem. As chances não costumam bater à porta de quem está parado. Desde o início, mantive uma postura de estar atenta, estudando, acompanhando o mercado. Isso é essencial para quem quer se destacar, ainda mais em uma área tão especializada como a arbitragem.

Comecei a trabalhar no segundo ano da faculdade, fazendo trabalho pro bono no departamento jurídico da São Francisco. Depois, estagiei em uma empresa e, em seguida, em um escritório de advocacia. No quinto ano, mudei para o período noturno para poder advogar e aproveitar uma oportunidade no escritório em que estava.

Depois de formada, considerei prestar concurso. Trabalhei um tempo assessorando um desembargador, o que me deu certeza de que a carreira pública não era para mim. Às vezes é preciso experimentar para entender o que se quer – ou o que não se quer. Isso vale para quem tem dúvidas entre áreas: civil, penal, arbitragem… A vivência ajuda muito a clarear.

Montei meu próprio escritório depois de trabalhar em dois outros. Sempre tive muitos clientes e fazia muito networking. Isso é fundamental: o vizinho, o carteiro, a amiga da academia – todos devem saber que você é advogado. É assim que você se apresenta ao mercado.

Um cliente importante me levou à FIESP, aonde trabalhei na diretoria jurídica, apesar de manter o trabalho em meu escritório. Foi aí que entendi a importância do trabalho institucional. O que vocês fazem aqui na NewGen é essencial. A gente trabalha para ganhar nosso sustento, claro, mas também tem que devolver algo ao mundo. E esse trabalho institucional é uma forma de retribuir.

Na FIESP, assumi a presidência da Câmara de Arbitragem e fiquei lá por cinco anos. Por questões de agenda, optei por voltar a focar na advocacia no meu escritório. Já tinha experiência com arbitragem, mas, depois da Câmara, essa atuação ganhou muito mais intensidade.

A atuação como árbitra veio naturalmente. Muitos perguntam: “Como faço para ser árbitro?” A resposta é: primeiro, seja um bom profissional. Especialize-se, seja reconhecido pelo seu conhecimento. E, claro, esteja visível – escreva, participe, contribua. Isso ajuda a construir uma reputação sólida.

Editoria da NewGen News: Atualmente, como a senhora concilia a advocacia com a atuação como árbitra?

Dra. Silvia Pachikoski: Hoje tenho um trabalho institucional no CAM-CCBC, com o Rodrigo e o Ricardo, que é uma honra, mas também demanda muito tempo. Quanto à arbitragem, minhas indicações vieram da minha trajetória como advogada. Não segui a carreira acadêmica, então minhas indicações não vêm do meio acadêmico, mas da prática. As pessoas me indicam porque conhecem meu trabalho, já estiveram comigo em casos, em audiências. A confiança vem da experiência. E a visibilidade também conta – escrever artigos, participar de eventos, palestras. Tudo isso ajuda a construir essa confiança que é essencial na arbitragem.

Editoria da NewGen News: Desde o início, atuar como árbitra foi um objetivo seu?

Dra. Silvia Pachikoski: Sim e não. Nunca acordei pensando “quero ser árbitra em 2020”. Mas, quando você entra no mundo da arbitragem, há uma expectativa pela primeira indicação. A primeira indicação a gente também nunca esquece, é uma conquista enorme, e quando ela vem, há o compromisso de fazer o melhor trabalho possível. Se você faz bem, vem a próxima indicação. Na arbitragem, é tudo uma questão de confiança: no coárbitro, no presidente do tribunal, no parecerista, na equipe. Tudo precisa funcionar em harmonia.

Editoria da NewGen News: A senhora é amplamente reconhecida no mercado de societário. Qual a sua visão sobre esse setor atualmente?

Dra. Silvia Pachikoski: As disputas societárias no Brasil têm duas vertentes. A primeira surgiu com a arbitragem doméstica. O Judiciário sempre teve dificuldade em lidar com essas disputas – falta de celeridade, falta de especialização. A arbitragem veio como alternativa mais eficiente e especializada.

A segunda virada importante foi em 2015, com a reforma da Lei de Arbitragem e do artigo 109 da Lei das S.A., permitindo que questões societárias também fossem levadas à arbitragem. Isso abriu espaço para inclusão de cláusulas compromissórias em estatutos sociais de companhias abertas, especialmente no Novo Mercado, e impulsionou o desenvolvimento de arbitragens societárias.

Hoje, temos arbitragens envolvendo desde sócios em limitadas até disputas em grandes companhias, inclusive abertas. O CAM-CCBC tem acompanhado esse movimento, inclusive criando regulamentos específicos para tratar dessas demandas complexas, muitas vezes envolvendo centenas de acionistas.

Editoria da NewGen News: E como a senhora se prepara para continuar atuando com relevância nesse setor?

Dra. Silvia Pachikoski: Estudo, estudo e mais estudo. Quanto mais a gente estuda, mais “sorte” tem. É preparação constante. Não dá para ir a uma audiência, palestra ou reunião com cliente sem estar preparada. A advocacia exige atualização contínua. Nenhuma oportunidade vem de graça. O sucesso – se é que posso me considerar uma pessoa de sucesso – é fruto de muito esforço.

Editoria da NewGen News: Outro papel institucional relevante que a senhora desempenha é o de coordenadora da Comissão de Assuntos Legislativos do CBAr. Como tem sido esse trabalho de proteção à arbitragem também em âmbito legislativo?

Dra. Silvia Pachikoski: Esse é um trabalho… trabalhoso — sendo redundante. Essa Comissão nasceu há quase 15 anos, talvez um pouco mais. Ela vem com uma preocupação muito clara de proteger a Lei de Arbitragem, manter esse ambiente hígido, sereno, sem grandes transformações.

Quando você começa a ter, num ambiente estável, a desconfiança de que a lei pode mudar, de que pode mudar o entendimento sobre um artigo, ou de que a jurisprudência pode se alterar, você gera um ruído. Uma parte internacional que está escolhendo o Brasil como sede da arbitragem, ou o CAM-CCBC como instituição para submissão da disputa, pode se sentir insegura e dizer: “Olha, eu prefiro discutir em Nova York ou em Paris do que no Brasil, porque lá o ambiente é mais barulhento, com perspectiva de mudança.”

Então essa Comissão nasce para zelar pela arbitragem e impedir ataques à Lei. Hoje temos 150 projetos de lei em andamento. Já foram mais de 50 ou 70 arquivados, e muitas notas técnicas foram produzidas. A do CBAr, de produzir material acadêmico, criar massa crítica e desenvolver o instituto da arbitragem de maneira neutra, nos permite, dentro da Comissão, zelar pela legislação e levar conhecimento ao Congresso Nacional.

Como sabem, Deputados e Senadores vêm de todos os rincões do país e de profissões diferentes — há médicos, veterinários, advogados, administradores, trabalhadores da indústria. No Brasil, não temos um currículo obrigatório para se eleger, basta ter votos e a confiança do povo. Por isso, é nosso papel levar conhecimento técnico e explicar por que uma proposta de criar uma “carteirinha de árbitro”, por exemplo, não é benéfica para o livre mercado ou porque ela está desalinhada com os padrões internacionais.

Fizemos diversas intervenções junto ao Congresso, tanto na Câmara quanto no Senado. E aproveitando para falar com a nova geração de arbitralistas: nós, brasileiros, não fomos educados a participar do processo legislativo. Achamos que o que acontece em Brasília não é nosso problema. Mas é, sim! O que é feito lá — a produção de leis — afeta ou pode afetar nossa vida todos os dias.

Então, faz parte da formação técnica dos advogados acompanhar o que está acontecendo no Congresso, tentando evitar retrocessos ou permitindo avanços que beneficiarão a sociedade. Isso é um ativo que poucos jovens buscam desenvolver, mas para mim, é uma forma importante de atuação. É o que chamamos de advocacy: defender institucionalmente um setor. E é um trabalho institucional possível, relevante e que vale a pena ser desenvolvido. Sempre achei que essa é uma área de atuação que merece atenção e especialização.

Editoria da NewGen News: Com certeza a atividade institucional é uma parte importantíssima do nosso trabalho como advogados, especialmente na arbitragem. A arbitragem é uma área que demanda muito tempo, dedicação e atenção, inclusive para o desenvolvimento de trabalhos institucionais. Sabemos que a senhora tem uma série de frentes de atuação muito relevantes, e gostaríamos de saber como faz para gerenciar seu tempo diante dessa multiplicidade de tarefas e responsabilidades?

Dra. Silvia Pachikoski: Acho que dois pontos são fundamentais para um bom advogado: organização e colaboração. E equipe! Nada se constrói ou se faz sozinho. Tenho comigo nessa entrevista a Jamyle e a Mariana, que fazem parte de dois times sem os quais eu não conseguiria fazer nada. Contar com quem pesquisa, com quem faz a primeira minuta, redige, vai atrás, se preocupa com a matéria… isso faz toda a diferença.

Ninguém advoga sozinho — digo, dá para advogar sozinho sim — mas, nesse ambiente de arbitragem, os casos são complexos e enormes. Precisamos de muitos braços. E contar com pessoas que querem participar, crescer e estudar é o que torna tudo possível.

Na verdade, acho até mais fácil advogar do que gerir pessoas. Dentro das estruturas, é preciso saber “girar os pratinhos” para conciliar todos os talentos: tem quem seja bom de fala, quem escreva bem, quem critique com precisão. Cada um tem suas habilidades, e nosso trabalho é organizar isso tudo.

E falando em organização, lembro de quando eu era ainda muito jovem — talvez no terceiro ou quarto ano da faculdade — e uma advogada com quem eu trabalhava teve um problema com um estagiário. Ela disse algo que nunca esqueci: “Silvia, advogar eu posso ensinar. Agora, responsabilidade… ou a pessoa tem, ou não tem. Eu não consigo ensinar alguém a ser responsável.” Então é isso: saber o que tem que ser feito, como combinar e cumprir prazos. Essa é uma grande característica para o sucesso, não deixar ninguém na mão.

Eu só consigo cumprir toda essa agenda porque tenho pessoas organizadas comigo, trabalhando com um fim comum — que é entregar, no final, uma petição, um parecer, algo pronto. É uma comunhão de esforços.

Editoria da NewGen News: Ao contratar novos profissionais, que te faz perceber que aquela pessoa tem potencial para uma carreira brilhante?

Dra. Silvia Pachikoski: Difícil essa pergunta! Acho que a primeira coisa é entender: que profissional eu estou procurando? Porque, como disse, uma equipe é feita de peças diferentes. Às vezes eu preciso de alguém super erudito, bom de pesquisa. Outras vezes, de alguém mega comunicativo, que saiba se expor e se colocar.

Mas, de forma geral, um bom currículo é importante. A pessoa se formou, fez cursos, fala línguas… Não dá para estar envolvido com arbitragem sem, pelo menos, falar bem inglês. Espanhol e francês também são ótimos. Espera-se que o profissional tenha pelo menos uma ou duas línguas.

Também valorizo os cursos de complementação. Hoje em dia, não existe mais isso de terminar a faculdade e parar de estudar. É preciso buscar especialização, mestrado.

E, ainda, a participação nos moots é extremamente relevante. Nós sabemos o quanto uma competição de arbitragem é desafiadora. Às vezes, no estágio, por mais que o chefe cobre, a experiência não é tão diversa quanto a do moot. No moot, você se expõe, se coloca, está entre amigos com o mesmo objetivo. E, na advocacia, vejo que quem participou de moot já sai três passos à frente.

Você pega dois profissionais com o mesmo tempo de formado, mesma experiência, mas aquele que foi a Viena, que participou do moot, tem uma visão estratégica, sabe ler e apresentar argumentos, sabe falar, se posicionar. É um grande diferencial.

Fico muito feliz que o CAM-CCBC seja um dos grandes patrocinadores do moot de Viena. Nosso pré-moot é um sucesso. E é muito bacana ver esses profissionais ficando prontos para o mercado. Ver gente que era do moot hoje ser advogado, ou mesmo sócio de escritório. Parece realmente uma missão com endereço certo.

Editoria da NewGen News: Se pudesse dar um conselho à nova geração de profissionais, qual seria?

Dra. Silvia Pachikoski: Acho que essa entrevista inteira é um grande conselho! A intenção aqui não foi ser professoral, nem maternal, mas vocês disseram que queriam saber de mim a receita do bolo para atingir o sucesso, ou pelo menos para chegar em algum lugar. Então, estudo, responsabilidade, dedicação, participação, generosidade e trabalho institucional — tudo isso faz parte da formação de um bom ser humano, de uma boa profissional, independentemente da área.

Mas, de novo: a advocacia é baseada em confiança. E a gente só transmite confiança se tiver estudado, se tiver experiência. É um passo de cada vez. Mas, se seguirem essa receitinha de bolo, no final vai ter uma cobertura deliciosa! Tenho certeza de que verei todas vocês — e todos da NewGen — tirando do forno um bolo bem apetitoso!

 

*       *      *       *      *

 

As palavras e insights de Silvia acerca da construção de uma carreira em arbitragem certamente serão de extrema valia para os interessados no campo. A NewGen agradece sua generosidade em compartilhar conosco sua trajetória e suas opiniões, contribuindo, assim, para o desenvolvimento e aprimoramento da nova geração de arbitralistas no país.

 

Postagens relacionadas

8 DE AGOSTO DE 2025

Relatório do Evento XI...

XI Congresso CAM-CCBC de Arbitragem e 17ª Conferência Bienal do IFCAI – Parte 2...

0

8 DE AGOSTO DE 2025

Relatório do Evento XI...

XI Congresso CAM-CCBC de Arbitragem e 17ª Conferência Bienal do IFCAI – Parte 1...

0

8 DE AGOSTO DE 2025

Relatório do 10º Encontro...

Relatório do 10º Encontro do Ciclo de Workshops “Inadimplemento, Dano e Arbitragem”...

0

8 DE AGOSTO DE 2025

Relatório do 9º Encontro do...

Relatório do 9º Encontro do ciclo de Workshops “Inadimplemento, dano e arbitragem”...

0

8 DE AGOSTO DE 2025

Do discovery a produção...

Do discovery à produção antecipada de provas em arbitragem: um breve contexto sobre a...

0

8 DE AGOSTO DE 2025

Entraves normativos da...

Entraves normativos da arbitragem tributária: uma breve análise do princípio da...

0

LOCALIZAÇÃO

São Paulo
Rua do Rocio, 220 – 12 andar – cj. 121
Vila Olímpia – São Paulo – SP – Brasil – 04552-000

Rio de Janeiro
Avenida Presidente Wilson, 231 – 14 andar – cj. 1401
Centro, Rio de Janeiro – RJ – Brasil – 20.030-905