O custo e o tempo do processo como incentivos à adoção de ADRs por start-ups

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O custo/tempo do processo como um incentivo à adoção de mecanismos adequados de resolução de conflitos por microempresas/startups

Leonardo Campos dos Santos[1]

“O processo custa dinheiro”[2]: essa pequena e não tão menos brilhante frase do Professor Cândido Rangel Dinamarco dá a exata ideia da onerosidade resultante do ato de demandar e ser demandado. De fato, processar e ser processado pesam no bolso de todo e qualquer litigante (aqui excluídos, evidentemente, os beneficiários da justiça gratuita e os que demandam pelo rito especial dos Juizados Especiais Cíveis).

Começa-se pelo recolhimento das custas iniciais (ou taxa judiciária, como preferem alguns), se autor ou réu-reconvinte, e termina com o recolhimento das custas de satisfação da execução, se vencedor exitoso e, se derrotado, com o pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.      Isso sem contar as diversas custas e despesas devidas no decorrer do processo (emolumentos, oficiais de justiça, cartas de intimações, acionamento de convênios, honorários periciais e por aí vai).

O custo do processo, em conjunto com o elemento tempo, sempre foram fatores levados em consideração pela comunidade jurídica, que vem buscando implementar e desenvolver mecanismos capazes de mitigar os efeitos deletérios desses males quase que inafastáveis. A demora na prestação jurisdicional, como bem pontuado pelo Professor Joel Dias Figueira Junior, gera “um descontentamento difuso por parte dos jurisdicionados”[3].

Com o advento de sucessivas crises financeiras globais, o experimento de fatores naturais de impacto mundial (pandemia da COVID-19, por exemplo) e a busca enérgica por soluções efetivas em menor espaço de tempo (exigência do mundo globalizado), o custo do processo e o tempo têm ganhado nova atenção pelas microempresas e startups, pois fatores sabidamente desagradáveis.

Evidentemente que, para uma microempresa ou startup, seja ela autora ou ré, um único processo é capaz de impactar o seu orçamento, situação que não se verifica, por exemplo, em grandes empresas cujos faturamentos alcançam bilhões e estão “acostumadas” a litigar sem dificuldades. Claro que toda generalização é perigosa, mas os casos práticos têm confirmado essa premissa.

É dentro dessa conjuntura que têm ganhado cada vez mais destaque os meios alternativos (ou adequados) de resolução de conflitos (mediação, conciliação, arbitragem), há muito conhecidos em nosso país.

A comunidade jurídica e empresarial tem particular afeição por eles (e assim devem continuar a ter) pois, via de regra, alcançam o objetivo de pacificação social em um menor período de tempo e, guardadas exceções (como é o caso da arbitragem), com menor desembolso de recursos financeiros. A mediação e a conciliação, exemplificativamente, são instrumentos acessíveis para microempresas e startups de baixo fluxo financeiro e, empregadas de modo apropriado, possuem efetividade similar a de outras técnicas de solução de conflitos.

A depender da natureza do litígio, exige-se a adoção de uma solução extremamente técnica, a qual pode ser proposta pelas próprias partes (autocomposição) ou, então, sugerida por um terceiro colaborativo e especializado. De outro lado, o caráter generalista imposto aos juízes estatais pelo fluxo e pela diversidade de demandas que lhe incumbem significa que, quando diante de disputas em campos muito especializados, nem sempre a jurisdição estatal consegue pacificar o litígio como um todo. Daí a importância de se considerar os meios adequados de resolução de conflitos.

Adentrando na análise dos mecanismos adequados, os mais conhecidos são, como mencionado acima, a mediação, a conciliação e a arbitragem. Os dois primeiros são classificados como autocompositivos porque são as próprias partes envolvidas no conflito que chegam a um “consenso”; já a arbitragem é conceitualmente tomada como mecanismo heterocompositivo pois a solução da controvérsia é delegada para um terceiro particular (árbitro), daí por que alguns a tomam como “jurisdição privada”.

Na mediação, as partes elegem um terceiro neutro e imparcial (mediador) que atua de forma independente e colaborativa com as partes, auxiliando-as a solucionar o conflito sem a imposição de soluções. Trata-se de um método adequado para relações jurídicas que se prolongam no tempo e necessitam de “restauração” após um conflito. Nesse método, o mediador atua para além do conflito em si; o principal objetivo é reatar as partes.

Por sua vez, a conciliação também conta com a figura de um terceiro neutro e imparcial (conciliador) que atua no sentido de sugerir soluções específicas e pontuais para o fim do conflito, as quais, se aceitas, são formalizadas em “acordo”. A atuação do conciliador é, digamos, restrita ao fim do conflito e não voltada para o relacionamento das partes para além dele (como se dá na mediação).

Essa diferenciação entre mediação e conciliação, esclarece-se, não é universalmente pacífica em âmbito doutrinário, mas é a que mais nos parece coerente defender a exemplo de autores como Luis Alberto Warat,[4] Adolfo Braga Neto[5] e Fernanda Tartuce.[6]

Por fim, a arbitragem, tida como método adequado “para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis” (Lei n. 9.307/96, art. 1º), serve para que as partes submetam “a solução de seus litígios ao juízo arbitral” (Lei n. 9.307/96, art. 3º). Na arbitragem, portanto, a solução do conflito é delegada para um terceiro, cuja decisão final tem caráter vinculante (impositiva) e é passível de ser executada compulsoriamente pela parte interessada.

Entretanto, para que os meios adequados de resolução de conflitos sejam efetivamente adotados no meio empresarial, a postura da gestão das empresas e de seus consultores jurídicos frente aos litígios deve mudar (e felizmente tem mudado).

A litigância feroz e altamente beligerante (característica humana decorrente do conflito de interesses) não é capaz de levar a um consenso sobre a adoção de um método adequado de resolução do litígio, daí porque o Poder Judiciário está abarrotado de milhares de demandas que poderiam ser tranquila e facilmente resolvidas com mediação e conciliação.

As vantagens da adoção dos meios adequados são inúmeras. Além de conferirem segurança jurídica para as partes, esses métodos têm a insuperável vantagem de solucionar o litígio em tempo consideravelmente menor se comparado com o processo convencional (jurisdição estatal). Não bastasse, a tecnicidade dos árbitros, mediadores e conciliadores é outro elemento de suma importância para conflitos que dependem de soluções estritamente técnicas e que não são solucionados com a mera “aplicação da lei ao caso concreto”.

Passou da hora de todas as empresas repensarem o conceito de litigar, especialmente as microempresas e startups, que possuem estrutura empresarial apequenada e não podem se dar ao luxo de gastar tempo e dinheiro com conflitos. Fica aqui nossa defesa – incansável – aos métodos alternativos como instrumentos eficazes e rápidos na solução de conflitos, especialmente no âmbito das microempresas e startups.

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[1]– Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – SP. Foi Pesquisador do programa PIBIC-CEPE da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo com o tema Impactos do Novo Código de Processo Civil na fundamentação das decisões judiciais como forma de mitigar o ativismo judicial. Membro da New Generation do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá. Membro da Comissão Especial de Direito Empresarial da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo. Especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – GVLaw. Membro Associado do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial – IBRADEMP. Advogado de Dinamarco, Rossi, Beraldo & Bedaque Advocacia. Assistente técnico da Professora Doutora Alessandra Orcesi Pedro Greco.

[2]– DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil: vol. II. 7. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 742

[3]– FIGUEIRA JR., Joel Dias. Arbitragem. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, p. 51.

[4]– WARAT, Luis Alberto. Surfando na Pororoca – O ofício do mediador. Florianópolis: Fundação Boiteux, v. III, 2004.

[5]– BRAGA NETO, Adolfo. Mediação – Uma experiência brasileira. São Paulo: CLA, 2017.

[6]– TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Civis. 2. ed. São Paulo: Método, 2015.

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