Relatório do 10º Encontro do Ciclo de Workshops “Inadimplemento, Dano e Arbitragem” NewGen

CategoriesBlog

Relatório do 10º Encontro do Ciclo de Workshops “Inadimplemento, Dano e Arbitragem” NewGen

Israel Couto[1]

 

 

No último dia 27 de maio de 2025, foi realizada a 10ª edição do Workshop sobre Inadimplemento, Dano e Arbitragem, promovido pelo New Generation CAM-CCBC.

Nesta edição, o tema central abordou a aplicação dos vícios redibitórios em operações de compra e venda de participação societária. O evento contou com a presença ilustre dos professores Daniel Carnaúba, Doutor em Direito Civil e professor da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Gisela Sampaio, Doutora em Direito Civil e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Laura Patella, Doutora em Direito Comercial e professora do Insper; e Thiago Marinho Nunes, Doutor em Direito Internacional e Comparado, professor de Resolução de Conflitos e Processo Civil no IBMEC-SP.

Como já é tradição nos encontros do Workshop, os participantes foram divididos em dois grupos, cada um orientado por uma dupla de professores convidados, com o objetivo de fomentar discussões e conduzir os grupos à proposição da melhor solução para o caso apresentado.

A dinâmica se desenvolveu a partir da análise de um caso fictício envolvendo uma típica operação de fusão e aquisição (M&A), que tratava da compra da totalidade da participação societária de uma determinada empresa. Os protagonistas da operação eram duas sociedades: Carryon Investimentos Imobiliários Ltda. (“Carryon” ou “Compradora”) e OL Participações S.A. (“OLSA” ou “Vendedora”).

Em síntese, a Carryon buscava adquirir um terreno que atendesse às especificações de um potencial cliente, a Datacom Soluções de Armazenamento Digital Ltda. (“Datacom”), interessada na locação de um espaço de, no mínimo, 10.000 m² para a instalação de um data center.

O imóvel em questão pertencia à Oil Land Imóveis Industriais Ltda. (“Oil Land”), subsidiária integral da OLSA. Assim, Carryon e OLSA ajustaram a compra e venda da totalidade da participação societária da Oil Land, pelo valor de R$ 13.500.000,00. No contrato, a Vendedora declarou que, embora o terreno tivesse 13.500 m², sua área útil era de 10.500 m². Declarou, ainda, que toda a área estava livre, na data da celebração do contrato, de quaisquer ônus, restrições ou embaraços que pudessem comprometer sua plena utilização. A transação foi concluída em 13 de março de 2024.

Paralelamente ao fechamento do contrato de compra e venda, Carryon e Datacom negociavam a locação do imóvel por R$ 35.000,00 mensais, partindo da premissa de que o imóvel dispunha de 10.500 m² de área útil. Advogados foram contratados para a elaboração do instrumento contratual, e as partes iniciaram a troca de minutas preliminares.

Contudo, pouco mais de três meses após a conclusão da venda, a Datacom informou à Carryon que, ao solicitar aprovação para o início das obras junto à prefeitura local, descobriu que parte da área havia sido objeto de um inquérito civil recém-instalado. O procedimento investigava supostos vazamentos de resíduos nocivos no subsolo, ocorridos anteriormente à venda da Oil Land, com potencial de contaminar a água e afetar as comunidades vizinhas. Em decorrência disso, em dezembro de 2024, 600 m² da área útil foram interditados, inviabilizando o negócio com a Datacom, que optou por desistir do contrato de locação.

Diante desse cenário, a Carryon iniciou procedimento arbitral contra a OLSA, pleiteando:

  1. a restituição proporcional do preço pago pela participação societária, correspondente aos 600 m² inutilizados;
  2. indenização por perdas e danos;
  • reembolso proporcional dos valores despendidos com o contrato de compra e venda (SPA) e com os profissionais envolvidos nas tratativas com a Datacom.

Os grupos foram então desafiados a apresentar soluções jurídicas para o caso, com foco em dois eixos centrais:

  1. a) qual regime jurídico seria aplicável — o de inadimplemento contratual ou o de vícios redibitórios;
  2. b) quais pedidos deveriam ser acolhidos pelo tribunal arbitral.

O Grupo 1, orientado pelos Professores Thiago Marinho e Gisela Sampaio, sob relatoria de Carolina Kayat, concluiu que, embora o regime de vícios redibitórios parecesse mais adequado ao caso, o ideal seria adotar ambos os fundamentos: vícios redibitórios e inadimplemento contratual.

Já o Grupo 2, supervisionado pelos Professores Daniel Carnaúba e Laura Patella, com relatoria de Fernanda Berthier, defendeu a aplicação do regime de inadimplemento, argumentando que, para se aplicar o regime dos vícios redibitórios, seria necessária a comprovação de má-fé.

Após as apresentações, os professores convidados compartilharam suas reflexões e provocações. A Professora Gisela destacou que, diante da cláusula de declarações e garantias e seu eventual descumprimento, seria cabível a aplicação do regime de inadimplemento. A Professora Laura concordou, acrescentando que também houve inadimplemento por parte da Carryon no dever de informar. O Professor Thiago Marinho alinhou-se a essa posição.

Enriquecendo a discussão, o Professor Carnaúba observou que o vício redibitório se insere na responsabilidade contratual de natureza dispositiva, ou seja, pode ter sua aplicabilidade convencionada entre as partes. Ressaltou, ainda, que o debate sobre a aplicação desse regime decorre de uma evolução histórica, na qual o conceito de prestação (cumprimento contratual) se tornou mais amplo. Com essa ampliação, os vícios redibitórios passaram a ocupar um espaço mais restrito.

O Workshop, nesta fase comemorativa de sua 10ª edição, proporcionou debates instigantes e um olhar aprofundado sobre a resolução de casos complexos. Exigiu, ainda, elevada sofisticação dos participantes na formulação de conceitos e estratégias sob as perspectivas material, societária e contratual.

 

[1] Advogado. Pós graduado em Direito Empresarial pela Universidade de Coimbra. Cursando LLM em Direito Societário no Insper.

Postagens relacionadas

8 DE AUGUST DE 2025

Entrevista com Silvia...

Entrevista – Silvia Pachikoski A Coluna dos Editores é um espaço dedicado ao...

0

8 DE AUGUST DE 2025

Relatório do Evento XI...

XI Congresso CAM-CCBC de Arbitragem e 17ª Conferência Bienal do IFCAI – Parte 2...

0

8 DE AUGUST DE 2025

Relatório do Evento XI...

XI Congresso CAM-CCBC de Arbitragem e 17ª Conferência Bienal do IFCAI – Parte 1...

0

8 DE AUGUST DE 2025

Relatório do 9º Encontro do...

Relatório do 9º Encontro do ciclo de Workshops “Inadimplemento, dano e arbitragem”...

0

8 DE AUGUST DE 2025

Do discovery a produção...

Do discovery à produção antecipada de provas em arbitragem: um breve contexto sobre a...

0

8 DE AUGUST DE 2025

Entraves normativos da...

Entraves normativos da arbitragem tributária: uma breve análise do princípio da...

0

LOCALIZAÇÃO

São Paulo
Rua do Rocio, 220 – 12 andar – cj. 121
Vila Olímpia – São Paulo – SP – Brasil – 04552-000

Rio de Janeiro
Avenida Presidente Wilson, 231 – 14 andar – cj. 1401
Centro, Rio de Janeiro – RJ – Brasil – 20.030-905